sábado, janeiro 27, 2007

NUM "RELAX" DA M`BOI

Sexta-feira. Mais uma noite chegou, trazendo consigo o frio. A garoa paulistana cobria a Estrada da M’Boi Mirim. Carros, ônibus e caminhões atravessavam essa estrada que de mirim tem apenas o nome.
Um cigarro tirado da boca foi jogado ao chão. Um homem, como tantos outros, depois de revistado por um dos seguranças, adentra um Relax for Man. Nomes de fachada como esse, ou Night Club, ou Boite tentam esconder os tipos de serviços prestados.
A fachada estava praticamente apagada, quase não sendo possível sua identificação. Resolvi entrar. Um segurança me perguntou: “É a primeira vez que você visita nossa Casa?” Disse que sim. E ele me entregou uma comanda dizendo: “São R$ 4 a entrada e você tem direito a um drink”.
Uma luz vermelha iluminava o ambiente: um salão amplo dividido em dois espaços. De- um lado ficavam os quartos; do outro, um balcão com bebidas, quatro sofás pequenos, cortinas nas janelas com vista para a estrada e uma jukeboxe (toca-disco). Patrícia, uma das “meninas”, pedia o tempo todo R$ 1 a seus clientes pra mudar a música.
No primeiro espaço, havia oito “garotas”. Algumas acertavam um programa, umas dançavam e outras ficavam esperando o chamado de algum cliente. Vários homens, uns jovens, outros parecendo pais de família e dois velhos, bebiam cerveja e vinho, riam e observavam as “damas”.
A mais extrovertida era Marlene, que dançava ao som de música sertaneja, com coreografia e tudo, sem nenhum pudor. Num dado momento, ela subiu em um sofá e fez um striptease completo, enquanto todos riam e aplaudiam.
Depois, foi possível ouvir conversas de alguns prsentes. Uma dama ao meu lado se queixava: “Estou cansada, quero ir pra casa.” Uma amiga perguntou: “Por quê?” Ela disse: “Porque tô desde às 8 da manhã (trabalhando), preciso descansar!” “E porque você não vai?” “Tô esperando o meu “marido... Ah! Ele chegou!” Ela foi ao balcão, pegou sua bolsa, despediu-se e foi embora.
De repente, um homem bêbado caminhou em minha direção e me perguntou: “Já escolheu alguma?” “Ainda não!” “Aquela morena é bonita... Vou dar 10 contos pra ela fazer um strip só pra gente!... Ô, Marcos... vem cá!” “ O que foi?” “Vou dar 10 contos praquela morena fazer um striptease pra todo mundo!” “Tá louco? Pega os 10 contos e já leva ela pro quarto.” E aquele mesmo homem me perguntou novamente: “Já escolheu alguém?” “Não sei, vai depender do preço.” “São R$ 25, mas se você chorar, elas fazem por R$ 20...”
Depois que os dois homens se foram dali, pude observar uma discussão a meu lado:
“Não! Tá muito caro.” “Tudo bem, eu faço por R$ 20” “Não, tá muito caro!” “Só pra me ajudar, tô aqui com você... Vamos pro quarto, mesmo que você não faça nada. É só pra me ajudar... Você não quer me ajudar?” “Quero, mas tá muito caro!”
Depois de algumas cervejas, fui ao banheiro, no final do corredor que separa os quartos. Era sujo, as paredes mal rebocadas, e os vidros da pequena janela estavam quebrados. Ao sair, observei que cada quarto tinha somente uma cama e um colchão, era pequeno e pouco ventilado. As paredes também estavam sujas. No corredor de acesso aos quartos, tinha um homem prestes a cheirar um papelote de cocaína. Estava diante da imagem de um santo pregada na parede.
Retornei ao primeiro espaço do salão, onde rolava música, risos e conversas. Fechei a conta e fui embora.
Na M’Boi, a garoa já havia parado, podendo-se olhar a Lua, que sempre ilumina a vida noturna dos freqüentadores, fixos ou não, dessa estrada que nunca foi inocente.



Luiz Carlos Spinola
Becos 8


Um comentário:

Anônimo disse...

DEMAIS!!! TEXTO BEM ESCRITO, DELICADO, CLARO, SENSÍVEL.
PARABÉNS.
VOCÊ PENSAVA QUE CONHECIA A VIDA EM UM PUTEIRO? PENSAVA ERRADO, COMO ESSE RELATO DEMONSTRA TÃO COMPETENTEMENTE.
GOSTARIA DE VER MAIS CRÔNICAS COMO ESSA SOBRE A VIDA NA PERIFERIA.
ABRAÇO A TODOS DO BECOS,
CÍCERO